"ANA CARDOSO: PROGRESSO" - MNAC de 24/10 a 29/11/2015
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Oblique-OnOff 2015 |
O projeto ECHOES consiste num ciclo de exposições individuais
que reúne jovens artistas de origem portuguesa, a trabalhar e residir fora do
seu país de origem. Artistas que apresentam, na sua maioria, um currículo
construído com exposições realizadas no estrangeiro, onde têm ganho crescente
reconhecimento, mas com pouco ou nenhum eco em Portugal. Ainda que a maioria
destes criadores procure divulgar o seu trabalho no país natal, com a
realização pontual de mostras, são de um modo geral pouco conhecidos e acabam
por estabelecer maior contacto com importantes centros artísticos
internacionais.
Durante cerca de um ano, o MNAC irá realizar um ciclo de
mostras individuais na parede de fundo do atrium do Museu. É neste espaço de
acolhimento que os visitantes são interpelados por trabalhos recentes ou
inéditos de nomes da diáspora cultural portuguesa, que espelham as novas
linguagens de criação artística contemporânea. O convite foi lançado a artistas
lusófonos estabelecidos em países com comunidades portuguesas relevantes ou em
crescente afirmação, nos cinco principais continentes de destino migratório.
Valorizou-se uma visão plural com perspetivas culturais diversas e experiências
artísticas distintas.
Sendo a arte uma área privilegiada para a abordagem de
questões políticas, económicas, sociais, etc., estes “Ecos” propõem também a
reflexão sobre questões pertinentes da atualidade: o reativar do impulso à
emigração, as miscigenações sociais e respetivas hibridizações culturais, os
diferentes modelos e parâmetros de integração e cidadania, a dicotomia no que
toca à identidade e o surgimento de novas geografias emocionais. Esta
iniciativa visa estabelecer a ponte entre as novas gerações de criadores
portugueses que estão fora do contexto nacional e o MNAC como espaço de excelência o contacto com a
arte contemporânea portuguesa e local de acesso à novidade que estimula novos
olhares sobre o real.
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Em Progresso, 2015 |
(…)
Desde 1839, por altura do nascimento do daguerreótipo, que o
pintor francês Paul Delaroche terá proferido a lendária frase “A partir de
hoje, a pintura morreu”, com base no seu conceito de pintura como mimetização
do real. Nos anos de 1960, Ad Reinhardt alegou estar a criar as últimas
pinturas que alguém poderia fazer. Por fim Arthur C. Danto decidiu declarar “A Morte
da Arte”, mas aquele que parecia ser um golpe derradeiro a todos os níveis, não
foi mais que um ponto de rutura para a (re)interpretação da arte, uma vez que a
questão centrava-se na narrativa e na definitiva alteração do seu curso, face
ao paradigma que Vasari ajudou a definir para a arte no período da Renascença.
Abriu-se então um novo caminho. O Turner Prize, surgido em 1984 começou por
distinguir pintores. Quase dois séculos depois de Delaroche, continuamos a
assistir ao aparecimento internacional de inúmeros artistas que escolhem a
pintura como seu meio preferencial de expressão artística.
Progresso traduz a ideia de “avanço”. Esse movimento para
diante que pressupõe em termos filosóficos a evolução da marcha no sentido do
desenvolvimento, de uma mudança evolutiva, teve forte expressão no século XX,
em particular devido ao modernismo que o promoveu para se destacar do que
considerava ultrapassado. Ainda que nos dias de hoje, o conceito de Progresso
possa transportar um cunho passadista, na sua essência contém o paradigma do
que está em aberto, do que abraça o advir.
Ana Cardoso, trabalha no provir da pintura não apenas como
medium, como técnica, mas como post-medium. A Ação deixa de ser apenas a do
momento de pintar para passar a explorar as partes que compõem a pintura, ou
melhor o processo de considerar individualmente cada elemento, a técnica, o
suporte e a matéria, como partes iguais do processo.
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ON OFF ON OFF-2015 |
O trabalho apresentado no MNAC é composto por um painel de 8
partes que se integra na parede através de uma relação cromática e de elementos
de desenho.
O painel é composto por 8 telas, 4 em formato de
paralelogramo com tonalidades entre o salmão e o vermelho ferro e 4 em formato
de losango de outra gama de cor, que varia entre um lilás acinzentado e um
cinzento malaquita. A parede retangular que recebe o painel, ao ser pintada
numa cor afim às utilizadas nos elementos do painel, passa também a ser parte integrante
do próprio trabalho de pintura, funcionando como suporte base que incorpora os
restantes elementos geométricos. Os losangos correspondem no seu tamanho a
metade dos lados maiores do paralelogramo e são dispostos em alternância,
criando um jogo de linhas diagonais, podendo o último elemento estar deslocado
do seu conjunto. Há o objetivo de criar com essa sequência a ilusão de uma fita
que mostra a frente e o verso, ao desdobrar-se na parede, ocupando-a de forma
maioritária, porque como diz Ellsworth Kelly, “O negativo é tão importante como
o positivo” (“The negative is just as importante as the positive”).
As telas trabalhadas de forma modular e autónoma, afirmam num
primeiro momento a monocromia, o geometrismo, a abstração que caracterizam o
trabalho desta artista. Está igualmente presente outra particularidade
frequente nas obras de Ana Cardoso, o interromper a lógica estabelecida com um
elemento que se desloca da sequência e se autonomiza, como que a preludiar um
novo trabalho. Na verdade, são necessários múltiplos para formar uma imagem,
mas cada tela é uma pintura independente, podendo ser reorganizadas e
re-instaladas por forma a criar um novo conjunto, uma nova peça.
Em interligação dos diferentes elementos surge o desenho com
ténues linhas que evocam redes, páginas digitais, etc., só quando nos
aproximamos percebemos o subtil pormenor de uma narrativa.
Nas palavras de Ana Cardoso: “para mim cada pintura é um
elemento de uma proposição infinita, tornando o processo da pintura contínuo”.
Uma postura pluridisciplinar que torna mais amplo o campo da pintura e a sua
relação com a história, cada nova proposta inscreve-se como um contributo
intermédio por forma a “instigar o progresso”.
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Flat Files-2014 |
Curadoria : Adelaide Ginga
Texto: Adelaide Ginga
Imagens : © Direitos Reservados